A Cellugy foi um dos grandes destaques do Ocean Plastics Innovation Challenge, desafio de design da National Geographic em que eu (Carla) tive a honra de participar como parte do júri na categoria de Economia Circular.
Além de levar o segundo prêmio na categoria de Design, a Cellugy também foi escolhida para receber investimento financeiro da Sky Ocean Ventures, co-organizadora do Desafio.
(Caso não tenha acompanhado, ou queira relembrar, nós publicamos aqui no blog textos com os finalistas e vencedores do Desafio, além de outra entrevista exclusiva com o fundador da Algramo, empresa chilena vencedora da categoria Economia Circular)
Agora é a vez das fundadoras da Cellugy, a indonésia Deby Fapyane e a espanhola Isabel Álvarez-Martos, compartilharem um pouco dos bastidores do seu projeto!
A entrevista foi gravada em dezembro de 2019, na sede da National Geographic em Washington, logo após o anúncio dos prêmios do Desafio.
Nós dividimos a conversa em três vídeos:
Na primeira parte, elas explicam o processo de cultivo/fabricação do EcoFlexy, a invenção que recebeu esses – e outros – prêmios. Para quem não entende tão bem a parte científica da coisa, no final do vídeo a Deby inclusive desenha o processo na lousa!
Na segunda parte, conversamos sobre o começo do projeto e os desafios e prioridades de agora. Elas trazem alguns insights muito interessantes sobre a necessidade de criar pontes entre a universidade e a indústria. Como garantir que pesquisas inovadoras como essa possam sair das universidades e atender as necessidades do mercado?
Na terceira parte, falamos sobre como essa iniciativa poderia ser trazida para o Brasil para aproveitar nossa abundância de resíduos de frutas. Elas também compartilham alguns desafios que enfrentaram enquanto mulheres em ambientes predominantemente masculinos… E oferecem alguns conselhos para quem está nesse caminho de empreendimento e transformação!
Se preferir ler ao invés de assistir, seguem abaixo as transcrições da entrevista. Depois de assistir ou ler, conta pra gente o que você achou nos comentários?
Entrevista com Deby Fapyane e Isabel Álvarez-Martos (Cellugy)
IA: Meu nome é Isabel. Sou CEO e cofundadora da Cellugy.
DF: E meu nome é Deby, sou CSO e uma das cofundadoras da Cellugy.
IA: Então, nós viemos da Espanha e Indonésia e criamos a empresa na Dinamarca, então somos uma equipe muito internacional.
Então conta para a gente o que é esse projeto. O que que vocês estão desenvolvendo?
DF: Na Cellugy a gente está repensando os princípios básicos da embalagem. Então estamos criando um mono-material que pode ter as mesmas funcionalidades básicas dos plásticos.
O nome da nossa invenção é EcoFLEXY.
EcoFLEXY é um material produzido a partir da biocelulose. A biocelulose não é celulose normal, que você encontra nas árvores. A gente cultiva esse material.
E essa biocelulose pode ser fabricada a partir de insumos não-comestíveis, como o bagaço que sobra nas fábricas de sucos de fruta. Então a gente tem um princípio básico de biosimbiose industrial, porque esses resíduos industriais de outras empresas são os nossos recursos. Estamos tentando expandir essa tecnologia para poder usar com qualquer tipo de sobra de fruta ou vegetais.
IA: Por exemplo, as cascas, as sementes, essas coisas que são consideradas resíduos agora. Que os fabricantes de alimentos não estão usando para nada – ou usam para algo que possui um valor baixo para eles.
É por isso que a gente está criando uma parceria com eles. Para oferecer uma solução a partir da economia circular. E, em alguns casos, o plástico pode até ser usado para embalar os próprios produtos deles, que são alimentos.
Dessa forma, você contribui para um modelo circular.
Então qual é o tipo de plástico que ele substitui? Que tipo de aplicações ou propriedades ele tem, comparando ao que existe agora?
DF: Sim, então. Eu acho que quando eu apresento nossa solução, na verdade, ela tem mais potencial do que parece. Porque a biocelulose pode ser usada como ela é, como um filme, porque ela é transparente, então você pode fazer um saco, você pode embalar comidas ou produtos orgânicos sólidos como sabonete, por exemplo.
E essa biocelulose também pode ser usada para fortalecer embalagens de papel, ou seja, aquelas embalagens de papel vão precisar de menos material. Ela torna a embalagem mais forte, porém mais leve, então acabam por economizar custos e recursos.
E esse tipo de biocelulose nós também podemos usar como laminação de papel. Se você conhece, por exemplo, a bandeja de papel dos alimentos que têm um tipo de laminação como barreira para ficar à prova de água. E essa laminação, na verdade, é feita com PET. Então você precisa separar depois o papel do PET, ou seja, não é 100% biodegradável.
Se eles utilizarem o nosso material como laminação, tornaremos aqueles papeis 100% biodegradáveis e compostáveis, enquanto ainda possuem as propriedades de resistência à água que eles precisam. O que quero dizer, então, é que o potencial é enorme para substituir tanto os plásticos visíveis como os que não são visíveis. Você vê o que pode ser visto – os plásticos de uso único, filmes plásticos.
Mas o que você não vê também são aqueles plásticos nas embalagens de papel que eles usam como fortalecedores ou como laminação. A gente consegue substituir essas coisas que você não vê e, assim, tornar os materiais 100% biodegradáveis, recicláveis e compostáveis também.
IA: Sim, porque, no momento, é uma mistura de materiais, porque você tem a polpa, as fibras da polpa e você tem o plástico, então no fim do ciclo você não pode reciclar, porque você não pode separar, certo?! Nosso material, no entanto, é quimicamente parecido com a fibra da polpa, embora seja, quer dizer, muito menor e isso gera um conjunto de propriedades completamente diferente, mas quimicamente ele é muito parecido, então isso facilita aquelas embalagens de produtos serem recicladas. Ou seja, você pode fazer mono-materiais, ao invés de uma combinação complexa de às vezes dez tipos de materiais empilhados juntos.
E é compostável também?
DF: Sim, pode ser compostado em casa… A gente já conseguir o certificado OWS de compostagem doméstica.
Então basicamente a gente enterrá-lo no solo, esperar quatro meses e ele vai desaparecer. Bem, você já não consegue ver mais nada em quatro semanas, porém estará completamente decomposto em quatro meses.
Mesmo em casa ou qualquer lugar?
DF: Sim, sim.
IA: Em casa. Nossa prioridade principal foi fazer em temperatura ambiente, que ele pudesse se decompor na temperatura ambiente. Porque no final das contas os benefícios, por exemplo, que plástico biodegradáveis estão trazendo para a sociedade, dizendo serem compostáveis, ainda requerem um sistema de coleta, pois eles só decompõem a partir de…
DF: … na compostagem industrial
IA: … sim, a partir de 60 graus e condições de umidade muito específicas que você não encontra no meio ambiente. Então no fim das contas ok, podem ser uma solução mais sustentável, mas no fim ainda não é perfeito, certo?! Então outra área que priorizamos foi fazer ser biodegradável em temperatura ambiente.
E se você puder explicar para as pessoas que não conhecem a parte científica.. O que acontece depois? É uma bactéria, alguma coisa que cresce a partir desse material? Vocês podem explicar como funciona?
DF: Sim. Nós desenvolvemos uma mistura especial de culturas bacterianas. Não especificamente só bactérias – é uma cultura mista. E essa cultura se alimenta de açúcar fermentável das matérias-primas que nós processamos antes e, depois, elas vão produzir esse material que chamamos de biocelulose.
E quando esses materiais crescerem, eles vão se parecer com um filme plástico. Também pode ser cultivado em suspensão na água e de lá levamos para os próximos processos derivados, seja para produzir películas, ou outras aplicações.
IA: Na verdade o processo que ela está descrevendo é um processo de fermentação. Para você ter uma ideia, é muito semelhante à maneira como se produz a cerveja. Na cerveja você também tem bactérias, leveduras e espécies que fermentam. Então o processo é muito parecido com isso.
DF: Sim, o mesmo tipo do iogurte.
IA: Isso.
As sobras das frutas são nossa matéria-prima bruta. Depois, das sobras das frutas, a gente extrai o açúcar.
Esse açúcar, então, é qualquer tipo de açúcar fermentável que a gente pode usar como meio para as nossas culturas de micro-organismos.
Esse açúcar vai para um processo de fermentação. O processo de fermentação, para você que não conhece, é como quando você fabrica a sua cerveja ou quando faz seu iogurte ou queijo.
Com o processo de fermentação a gente consegue o filme úmido – este é filme úmido.
Então temos esse filme úmido, que também chamamos de hidrogel, de biocelulose. Em seguida, fazemos o processamento químico e a secagem e então temos as folhas EcoFLEXY. E essas folhas de EcoFLEXY podem ser customizadas com funcionalidades diferentes.
Por exemplo, com diferentes níveis de barreira de oxigênio ou diferentes graus de resistência à água. Ou ainda se você quiser torná-las coloridas ou se deseja imprimir nelas ou torná-las completamente transparentes. Então dependendo do que o cliente deseja, a gente pode customizar. É isso.
Maravilhoso.
DF: Então quando você coloca EcoFLEXY no solo, ela vai desaparecer em cerca de quatro semanas, e será integralmente biodegradada em compostagem doméstica em aproximadamente quatro meses. Então você não vê mais o material, ele vira alimento para as plantas do lugar.
Maravilhoso. E a sobra do processo você comentou que é só vinagre?
DF: É o processo de fermentação, então basicamente o que temos é o filme úmido e o resíduo é somente o vinagre. Esse vinagre, na verdade, pode ser reprocessado de volta no processo de fermentação como um novo meio para as bactérias.
Assim a gente pode diminuir o consumo de água no futuro. Também estamos pensando em vender o vinagre, como outra fonte de renda. Porque as bactérias que nós estamos usando são probióticas, então ele é completamente seguro para alimentação também. É.
E como começou o projeto? Como vocês descobriram ou decidiram trabalhar com isso?
DF: Então…
IA: … então…(risos)
DF: … ok. A Isabel e eu estávamos no mesmo laboratório. Nós somos cientistas e eu estava fazendo meu doutorado e ela seu pós-doutorado na Universidade de Aarhus na Dinamarca. E a Universidade de Aarhus tem um desafio anual para os alunos elaborarem propostas de soluções para certos desafios. Este foi um desafio sobre plásticos e economia circular.
Então estávamos pensando nisso… Fomos ao supermercado, pensando: “É muito plástico, o que podemos fazer? O que podemos fazer?”
Como eu estava estudando nanociência, fiquei sabendo de maneiras de fazer certos materiais de tamanho nano. E foi ideia da Isabel – que tal a gente fazer isso a partir das sobras de frutas?
Então eu fiz isso acontecer… A gente ganhou o prêmio… e recebeu muito apoio das pessoas, dizendo como tinham gostado da nossa ideia. Um tempo depois disso a Isabel ganhou um prêmio numa aceleradora chamada “Climate Kick”, na Escandinávia. E quando você recebe o dinheiro, você precisa abrir uma empresa. Então foi assim que a empresa foi formada.
IA: Sim. Quer dizer… como cientistas, nós fomos muito, digamos, desafiadas nessa competição. “Então por que vocês não fazem isso acontecer? É uma ideia muito boa, vocês venceram essa competição, mas vocês têm que fazer isso acontecer. Se não, vai ser só mais um bom projeto que fica numa gaveta em algum lugar.
Então isso também nos motivou um pouco para realmente fundar a empresa e tentar trazer essa solução – que começou como uma ideia para um produto. Sim, é onde a gente está agora, um ano e meio depois. As coisas estão mudando bastante, então… sim. O tempo voa.
E quais são os seus maiores desafios agora?
DF: Eu acho que o principal desafio para toda tecnologia nova é como ampliar a escala, e como ajustá-la ao maquinário já existente. Porque o que nós estamos tentando fazer aqui é produzir material. E isso precisa de um CAPEX alto, que é a despesa em bens de capital como o investimento em máquinas, etc.
Então a gente está tentando o máximo possível não precisar criar equipamentos especiais. A gente precisa encaixar o nosso processo nos equipamento existentes. Então é isso que estamos fazendo. Como produzir em escala, como produzir mais rapidamente, como aumentar a eficiência – é o que estamos investigando agora.
Em que ponto vocês estão agora?
DF: Atualmente nós temos capacidade de produzir, mas ainda de maneira artesanal. Estamos um pouco acima da escala de laboratório.
IA: Porque nós começamos na escala de laboratório. Quando se fala em escala de laboratório, você está usando só umas lâminas pequenas.
DF: Tubos pequenos..
IA: … Sim, exatamente. Quer dizer, o processo é gradual. Então você não consegue ir de, por exemplo, 10 mililitros para um recipiente de 50.000 litros. Você precisa fazer aumentar a escala de maneira prudente.
Nós agora estamos em uma escala de cerca de 30 a 40 litros. Com certeza, estamos fazendo algumas otimizações para podermos produzir o máximo de material nesta etapa. E a partir disso podemos mudar para 1.000 litros, mudar para 5.000 litros, e assim por diante. Realmente… porque… Sim, a química, a física, as reações não são as mesmas quando você aumenta a escala para esses recipientes. É aí que a gente está no momento.
Então nosso principal objetivo para o próximo ano é montar nossa própria linha piloto. Para sair desse processo artesanal para algo que já é automatizado e que tem um processo de ponta a ponta, e permite produzir uma quantidade suficiente de material para que os parceiros que já têm interesse possam experimentar.
Vocês estão fazendo essa ponte entre universidade e indústria, certo? Sei que no Brasil também temos muitos estudos interessantes nas universidades com novos materiais produzidos a partir de resíduos, mas eles ainda não estão sendo usados. Enquanto muitas pessoas da indústria dizem: “nós realmente queremos usar plásticos biodegradáveis, mas onde eles estão? Eles não são competitivos, eles não têm um preço acessível”. Então como vocês enxergam isso? Vocês acham que esse tipo de financiamento e desafios como este ajudam a transpor essa lacuna?
IA: Sim… Eu diria que a principal questão que temos entre a academia e a indústria é o fato de que às vezes você tem pesquisas muito boas, no nível acadêmico, mas provavelmente você não pensa muito em trazer isso para a indústria.
Então.. a gente não está tentando fazer uma pesquisa de dez anos sobre esse material, ou sobre como as bactérias se comportam e assim por diante. O que seria muito interessante, para compreender uma série de coisas que no momento não entendemos.
Mas é melhor só levar isso para fora da universidade. Levar até o mercado para ver a necessidade das pessoas e como nós podemos produzir isso para elas. Dessa forma você encontra uma aplicação e um potencial de colaboração. E nós estamos em um estágio no qual eles podem realmente moldar o produto como desejam, pois é um estágio muito inicial.
Então nós tentamos realmente preencher essa lacuna, que já observamos a partir de experiências passadas.
DF: É, porque geralmente no mundo acadêmico as pessoas passam 10 anos desenvolvendo uma tecnologia, e depois começam a sair e perguntar para a indústria: “vocês querem isso? Conseguem fazer algo com isso?”. Mas a indústria diz: “não, não precisamos disso”, porque talvez eles precisam de algo completamente diferente. Talvez da mesma base, e se você ajustar de outra maneira eles irão querer usar.
Então o que estamos fazendo agora é que, na verdade, temos a ideia, desenvolvemos uma versão não-super-perfeita e então estamos mostrando a possibilidade e, como dizer isso, os potenciais para os nossos parceiros falando: “se você quiser, também podemos fazer assim”. Depois os ouvimos: “ah, sim, nós queremos que seja assim, que seja A, B, C, D e…” essa é a direção que estamos seguindo com eles.
Portanto, no final, a aplicação será bastante adequada ao que eles precisam.
IA: Sim.
DF: Esse é o fluxo de como desenvolvemos um produto na empresa. Então nós sabemos em qual mercado estamos focando e qual parceiro vai usar esse produto no final do desenvolvimento.
IA: E eu também diria que outra das nossas questões principais é que quando você está pesquisando você não presta atenção em quanto isso vai acabar custando se eu for produzir em escala industrial.
E isso é algo que a gente está o tempo todo tentando equilibrar – certo, nós podemos fazer dessa forma, mas então qual será a implicação nos custos? Porque no final das contas com certeza isso precisa estar dentro da margem do que eles usam agora ou, digamos, 10% no máximo de extra.
Isso também é uma espécie de desenvolvimento que você precisa fazer. Você pode ter produtos ótimos cientificamente, mas se eles não forem economicamente competitivos ninguém vai querer, certo? Então, realmente, você precisa reciclar o processo várias vezes até encontrar a receita certa.
Nós estamos sediadas no Brasil, então eu sempre me pergunto como isso pode inspirar, ou como pode funcionar no Brasil, o que significa para as pessoas no Brasil. Então vocês.. vocês disseram que estão patenteando essa tecnologia. No Brasil nós temos muito desperdício de frutas, somos um grande produtor de frutas.
Então vocês vêm isso como uma possibilidade, licenciar a tecnologia para outros países que tenham essa grande produção – imagino que seja bem maior que na Dinamarca, certo?
IA: Sim, com certeza.
Então como vocês imaginam uma possível cooperação com o Brasil?
IA: Sim, então basicamente nosso modelo de negócios para levar esse produto ao máximo de pessoas é o modelo de licenciamento. É por isso que as patentes são tão importantes para nós enquanto empresa.
A forma que nós pretendemos fazer no futuro então é licenciar essa tecnologia. Por exemplo: empresas químicas que já têm uma infraestrutura instalada podem utilizar nos seus países de origem e com recursos que têm na região.
Então eles nem precisam gastar muito com logística também. Porque você não quer, por exemplo, embarcar as sobras do Brasil para Dinamarca, digamos, para produzir o material lá e depois embarcar de volta para o Brasil.
A maneira que a gente imaginou esse modelo de negócios é que você vai ter, vamos dizer, unidades locais, pelo menos em termos de país. Então alguém no Brasil poderia realmente licenciar a nossa tecnologia para usar as matérias-primas locais e produzir lá o material.
Temos várias etapas no processo, e todas elas podem acontecer de diferentes lugares. Então, por exemplo, o pré-tratamento é muito semelhante, digamos, ao processo que temos agora para a produção de bio-etanol. Portanto qualquer produtor de bioetanol poderia se adaptar, digamos, ao processamento desse tipos de insumos para produzir o meio para a nossa cultura.
Depois alguém pode usar isso para a fermentação em si. É um processo gradual de tipo duas, três etapas pelo menos, o que requer diferentes tipos de parceiros.
E outra dúvida, de um outro ponto de vista: vocês já passaram por qualquer desafio sendo uma equipe inteiramente feminina?
DF: Oh, bem…
IA: A gente tem várias histórias sobre isso…
DF: … sim, nós somos na verdade três cofundadores. E o outro, além de nós duas é “o homem”, mas ele é sempre fala pra gente ir…
IA: … coitado, né? Então nós somos cientistas, ou seja, só a transição do mundo científico para o mundo corporativo já foi um salto para nós. E também, no mundo dos negócios, a maioria é de homens.
Então nossa primeira experiência, minha primeira experiência… eu nunca vou esquecer, certo? Eu entrei numa sala e ela estava cheia com quarenta homens e eu. Ou seja, eu era a única mulher na sala.
Claro, no começo é chocante, porque você está entrando em uma diferente…. não é a sua zona de conforto, então não é sua atmosfera natural e, claro, é um pouco difícil no começo. Às vezes, sim, a gente sempre recebe alguns comentários que não são muito profissionais e…
DF: A última vez, a gente encontrou com um dos, digamos, parceiros e ele disse: “oh, é muito legal ver duas moças bonitas realizando um projeto de ciência como esse”, eu pensei tipo: “o quê?” Se fossem dois homens bonitos ele também falaria assim? “Oh, muito legal os rapazes bonitos fazendo ciência”. Então a gente ficou um pouco ofendida. Esse tipo de comentários desnecessários a gente ouve bastante.
IA: Isso também às vezes ajuda, quando você está em uma sala cheia de homens, com certeza eles vão lembrar de você. Então isso ajuda a reconhecer o projeto. Ou seja, às vezes também funciona ao nosso favor, certo?
Eu acredito que o que nos fez estar aqui hoje é o fato de que nós não desistimos facilmente. As pessoas dizem que nós somos batalhadoras, então isso é bom, quer dizer, você acaba achando o seu caminho, certo? Para construir as coisas e para equilibrar as coisas, sua vida pessoal e profissional.
DF: E nós também somos gratas por termos parceiros que entendem o que estamos fazendo. Eles não reclamam.. bom, às vezes… mas, quero dizer, eles apoiam a causa na qual acreditamos, então nós também somos gratas por isso.
IA: Quer dizer, é um desafio, porque a nossa empresa é uma empresa de biotecnologia. Uma empresa de biotecnologia exige muito capital para ter um processo e um produto bem, bem robustos.
Então tem sido um ano de teste, digamos, porque, quer dizer, começamos sem recursos, sem equipamento, sem acesso a nada, então … Mas no final conseguimos! E também você sente gratidão pelas pessoas que estão dispostas a te ajudar, porque elas acreditam em você.
Elas acreditam no que você está fazendo. E, na verdade, eu diria que esse é um dos maiores aprendizados na nossa experiência como uma startup. Essas pessoas que estão lá te apoiando, não importa o que aconteça. E sim …
DF: É nessas pessoas que você precisa acreditar, e agradecer por elas. Elas estavam dispostas a ajudar quando a gente não tinha nada além da ideia.
IA: E elas são tão apaixonadas quanto nós pelo projeto.
DF: Sim, sim.
Eu acho que isso é muito legal para uma parte do nosso público no Brasil que também são empreendedores e pesquisadores, tentando fazer coisas em um ambiente não muito favorável, sem muitos recursos… Então eu acho que o que você disse já é ótimo. Vocês têm mais alguma mensagem que vocês gostariam de deixar para as pessoas no Brasil que querem fazer esse tipo de inovação circular, apesar das adversidades?
IA: Vejamos… o que eu diria é que se você tem algo em que você acredita… você tem que tentar. Porque nunca é provavelmente o momento certo, e as coisas nunca vão estar perfeitas, mas se você não tentar, não vai acontecer mesmo. Então é uma experiência muito proveitosa. É muito desafiadora, você tem muitos pontos baixos, mas também pontos altos muito gratificantes no caminho.
Você conhece muitas pessoas interessantíssimas, e eu diria que você se desenvolve bastante, então meu conselho seria: tente.
DF: Sim. Simplesmente tente, porque se você não tentar, nunca vai saber se ia conseguir ou não. Caso você não consiga de um jeito, pelo menos você tentou, e você vai usar isso para uma nova chance que virá, porque você vai ter aprendido muito.
Você ganha tanto experiência pessoal quanto profissional. Então simplesmente acredite no que você acredita. Se você quer tentar, vá pra cima e se cerque de pessoas que lhe apoiam ao longo da caminhada, e seja grato por elas. Sim.
IA: E então vem os nossos pais: “Quando você vai arrumar um emprego normal?”
Parabéns! Muito obrigada pelo trabalho de vocês. E por acreditarem em si mesmas e chegarem até aqui, e a todos os lugares que eu sei que vocês vão chegar a partir daqui.
DF: Oh! Obrigado você por ajudar a compartilhar nossa história…
IA: Sim
DF: …e espero que ela possa motivar outras pessoas a fazerem o que elas acreditam.
Sim, obrigada por nos ouvirem! Acreditem em si mesmos e na sua ideia. E boa sorte